IGREJA-SOCIEDADE ALTERNATIVA

A explicação do sentido desse título, está em ARQUIVO DE POSTAGENS, out. 29 de 2011

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Religião católica romana (e outras) não sintonizam com o evangelho de Jesus cont.(p 56)

No post anterior, o texto do teólogo Castillo que estou reproduzindo, coloca como conclusão de suas excelentes considerações: a Igreja institucional está inadaptada na sociedade e na cultura atual.O cristianismo precisa se apresentar em perfeita coerência com a maneira de pensar e com a forma de viver da grande maioria das pessoas do nosso tempo.

Este posicionamento é discutível. De minha parte apoio versão muito diferente (quase oposta) defendida pelo teólogo-biblista Gerhard Lohfink no seu livro "Como Jesus queria as comunidades?" (Ed.Paulinas). Por não ser esta uma questão menor mas ao contrário, de suma importância, me atrevo a resumir o que Lohfink desenvolve em vários capítulos, a temática de uma "Igreja sociedade de contraste"; você,então, poderá imaginar a diferença que isso acarretará na própria configuração eclesial.

Israel, por sua eleição, se considerava com razão, povo de Deus. Na Bíblia, povo de Deus foi sempre compreendido como sociedade de contraste, uma nação diferente.Povo de Deus é aquele Israel que segundo a vontade de Deus, se deve distinguir de todas as nações da terra (Dt 7,6-8). Deve ser um povo santo com uma ordem social que o distingue das outras nações.A santidade (povo santo) de Israel depende do fato de viver a ordem social que Deus lhe concedeu (Código da Aliança, Ex 20,22-23,19) e que está em nítido contraste com as ordens sociais de todos os outros povos. (Lv 20,26).

Israel falhou na realização deste projeto divino. JESUS então vem restaurar,reconstituir seu povo para realizar definitivamente seu plano de ter um povo santo no meio das nações.Sem este pano de fundo, o movimento de reconstituição em Israel por parte de Jesus é incompreensível. O fato de Deus ter elegido e santificado seu povo para fazer dele uma sociedade de contraste entre os outros povos é também para Jesus o "pano de fundo" evidente de toda sua atividade. Ele visa o verdadeiro Israel escatológico no qual é vivida a ordem social do Reino de Deus.

"Jesus nunca convocou para uma mudança político-revolucionária da sociedade judaica. Mas a conversão que ele exige como consequencia de sua mensagem do Reino de Deus, quer desencadear , dentro do povo de Deus, um movimento, frente ao qual as revoluções costumeiras são bagatelas."

A IGREJA PRIMITIVA compreendeu esta intenção de Jesus ? Deu-lhe continuidade? As comunidades neo-testamentárias compreenderam-se como contraste ao paganismo (cultura greco-romana em especial) , como povo santo que deveria ser diferente da sociedade pagã. No Novo Testamento em múltiplos conceitos e estruturas maiores de discurso aparece o conhecimento da Igreja como sociedade de contraste de Deus no meio da sociedade restante.

Aqui o autor destaca alguns textos do NT e os comenta em comprovação do que afirmou antes.Em continuação lembra o Mt 28,19 sobre o mandato da missão universal.E se questiona: este mandato não exige que uma comunidade se identifique profundamente com a situação dos povos em todas as partes do mundo? Manter-se em contraste,não seria um elitismo, sectarismo, traição ao universalismo cristão? Em várias páginas o autor mostra pela própria Bíblia, que não contradizem o "Ide, portanto,e fazei que todas as nações se tornem discípulos..."
Em seguida conclue:
"Nossa amostragem realizada em At 15,Lc 2, Rm 9-11 e na epístola aos Efesíos, mostrou claramente: Igreja como sociedade de contraste não significa oposição à sociedade restante por causa da oposição.Igreja como sociedade de contraste significa muito menos ainda desprezo da sociedade restante a partir de um pensamento elitista.Significa simples e unicamente o contraste em favor dos outros e por causa dos outros, isto é, aquela função de contraste, formulada de modo insuperável nas imagens do "sal da terra",da "luz do mundo" e da "cidade situada sobre uma montanha" (Mt 5,13s).

Exatamente porque a Igreja não existe para si mesma,mas única e exclusivamente para o mundo, ela não pode tornar-se mundo, mas deve preservar sua própria fisionomia. Se perder seus contornos, se sua luz se apagar, se deixar seu sal tornar-se insosso, ela não pode mais transformar a outra sociedade. Então nenhuma atividade missionária adianta mais nada; então também não adianta mais nada um engajamento social para fora por mais ativo que seja."
Há séculos as igrejas cristãs quase não conhecem mais o sentimento do contraste para com a sociedade. As Igrejas da Europa ocidental identificaram-se em sua mentalidade de uma maneira consternadora com a sociedade restante e suas estruturas.
Até aqui o resumo do que diz o Lohfink.

No Brasil existe essa mesma identificação da Igreja com a sociedade restante. Por outro lado, a mentalidade social, tanto lá como cá, está impregnada pela ideologia dominante do capitalismo, cujos valores são contrários aos do Evangelho.Como pois concordar com a proposta, como faz o teólogo Castillo, de a Igreja, os cristãos se colocarem em perfeita coerência de pensamento e ação com as pessoas do nosso tempo ? Que a Igreja como Instituição, como organização burocrática não democrática, com legislação ultrapassada que contradiz sua origem evangélica, cause rejeição e seja considerada não adaptada a um certo progresso positivo da humanidade, como sugere o autor, é compreensivel.
Mas que ela se iguale com o modo de pensar e viver capitalista das nossas populações ocidentais, ou outras, cuja ideologia dominante seja também eivada de valores não cristãos, não é plausível.

No próximo post vou continuar transcrever o texto do teólogo Castillo.