IGREJA-SOCIEDADE ALTERNATIVA

A explicação do sentido desse título, está em ARQUIVO DE POSTAGENS, out. 29 de 2011

quarta-feira, 20 de junho de 2012

Concentrações massivas:será essa a solução? cont. (p96)



No post anterior, dei informações genéricas sobre as  JORNADAS MUNDIAIS DA JUVENTUDE ( JMJ) e como anda a preparação desse evento internacional, tanto por parte da CNBB quanto por parte da arquidiocese do Rio de Janeiro sede das atividades em julho de 2013. E deixei anunciado para os posts seguintes, avaliações sobre o significado e a suposta validade desse empreendimento.
Como primeira contribuição trago uma entrevista feita para o IHU On- Line e divulgada pela agencia ADITAL, com o jesuita pe. Hilário Dick, doutor em Letras, dono de produção literária e ações pastorais voltadas para os jovens.
Selecionei os trechos da entrevista referentes ao nosso assunto: a JMJ. Antes, uma introdução à entrevista.

   
 "A Igreja precisa possibilitar e incentivar a construção da autonomia. É a partir dessa percepção que Pe. Hilário Dick (foto) critica as práticas da Igreja e sua relação com a juventude. Para ele, a Jornada Mundial da Juventude – JMJ, evento católico que reúne o maior número de jovens em todo o mundo desde 1980, tem uma pedagogia que não conduz "à transformação social” e tampouco possibilita o protagonismo juvenil na Igreja. "Não se nega que um e outro jovem mude de valores, se ‘converta’, que descubra Jesus Cristo etc., mas poucos são os dados que fazem que o jovem descubra mais a realidade social ou, até mesmo, a própria realidade juvenil em termos mais amplos”. E complementa: "A maior prova disso está na observação de quem é o protagonista das Jornadas: quem fala? Quem decide? Quem ocupa o palco? De forma um tanto dura podemos dizer que a juventude das JMJ é uma massa de manobra da Igreja-Instituição”, provoca, em entrevista concedida à IHU On-Line por e-mail.
Em contato com a juventude há mais de 40 anos, ele assegura que, apesar das limitações, "a Igreja e a juventude se encontram: a Igreja naquilo que ela deveria ser e a juventude naquilo que ela sonha com uma instituição como a Igreja”. E explica: "A juventude quer vivência grupal. Nunca houve tanta busca dessa vivência como nos dias de hoje. É falso dizer que a juventude não quer viver em grupo. Por outro lado, a essência da Igreja é ser comunidade (ecclesia). Não se entende uma Igreja que não seja e não promova a comunidade, o grupo. Por isso a juventude espera acolhida”. Para que esta aproximação seja possível, sugere, o trabalho pastoral com os jovens deve ser entendido como um processo, "que acontece no dia a dia, nos pequenos grupos que se encontram para relacionar-se, viver, estudar, enfrentar questões comuns, celebrar "
Confira a entrevista.
IHU On-Line– Como o senhor avalia a trajetória da Jornada Mundial da Juventude– JMJ? A JMJ é uma apresentação da Igreja para os jovens ou revela o engajamento e a relação da juventude com a Igreja?
Hilário Dick – Quando é que podemos falar de "trajetória” de um evento? Basta ver as datas, o número de participantes, os locais, a reação da sociedade, a repercussão na Igreja, o preço do evento? Qualquer "movimentação” se caracteriza pelas preocupações que manifesta, pelas ideias que defende, pelas propostas que carrega. É mais do que um ajuntamento de datas, de número de participantes, de número de discursos ou "sermões” que se fizeram, de tipos de hinos que foram cantados etc. Por isso, somente com um estudo em profundidade poder-se-á falar de uma possível trajetória das JMJ.
Quanto à segunda parte da pergunta, as Jornadas Mundiais estão provando que elas são muito mais uma apresentação da Igreja para os jovens do que um engajamento dos jovens com a Igreja. A maior prova disso está na observação de quem é o protagonista das Jornadas: Quem fala? Quem decide? Quem ocupa o palco?De forma um tanto dura podemos dizer que a juventude das JMJ é uma massa de manobra da Igreja-Instituição. Assim como não se fala de Reino para esta juventude, insiste-se muito no amor à Igreja. Não podemos dizer que o seguimento de Jesus não é desenvolvido, mas não é o que as juventudes enxergam e ouvem de forma mais significativa.
IHU On-Line – Como explicar a receptividade da Jornada por parte dos jovens? Qual o significado desses eventos massivos? A JMJ tem um viés transformador?
Hilário Dick – Todo jovem gosta de viajar e de participar de um evento em que se encontram muitos jovens. Isso vale para dentro e fora da Igreja. O Papa João Paulo II, além de seu carisma no relacionamento com os jovens, foi transformado num "Papa Pop” como até cantam os Engenheiros do Havaí. Pelo caráter que tinham e têm as JMJ, os meios de comunicação não tiveram nem têm dificuldade em assumi-las.
Existem dois modos de trabalhar pastoralmente com os jovens: ou priorizando uma pastoral de eventos, de grandes concentrações, de movimentos massivos com muito marketing, muita visualidade etc., ou priorizando uma pastoral de processos, essa que acontece no dia a dia, nos pequenos grupos que se encontram para se relacionar, viver, estudar, enfrentar questões comuns, celebrar etc. A Igreja Católica está priorizando, nesse momento, de muitas formas, a pastoral de eventos. É em tal geografia que se situam as JMJ.
Pela pedagogia que se usa nas JMJ pode-se dizer que elas não levam à transformação social. Não se nega que um e outro jovem mude de valores, se "converta”, descobre Jesus Cristo etc., mas poucos são os dados que fazem que o jovem descubra mais a realidade social ou, até mesmo, a própria realidade juvenil em termos mais amplos. Basta recordar o significado que tiveram as mobilizações juvenis na Jornada Mundial de Madrid. A juventude fora da Igreja parece que não existe
IHU On-Line– Como construir, a partir dos movimentos de grupos, das pastorais da juventude, a autonomia dos jovens que participam da Igreja?
Hilário Dick – Critico a pedagogia, porque as JMJ não garantem a participação da juventude. Se houvesse e se possibilitasse real participação, haveria protagonismo juvenil. Só se constrói autonomia, personalidade, identidade numa boa participação, e uma boa participação significa uma boa organização, onde o protagonismo juvenil seja o exercício da autonomia etc. Podemos dizer que a autonomia é o tendão de Aquiles da Igreja porque se trata do exercício do poder. E a Igreja Católica, hoje e na história, tem muita dificuldade na vivência evangélica do poder. Isso vale para todos, também para o povo de Deus, em geral, e de modo especial para a juventude que vive a descoberta da liberdade (saindo do mundo da dependência), da participação e da autonomia. Esse aspecto fica evidente na forma como são vivenciadas as JMJ. Apesar disso, na teoria, o paradigma que a Igreja defende (assume?) é o da construção da autonomia. Uma das coisas que mais afasta a juventude da Igreja é a esquizofrenia, afirmando uma coisa e fazendo outra, na prática.
IHU On-Line – O que espera da visita do Papa ao Brasil no próximo ano, quando participará da Jornada Mundial da Juventude, no Rio de Janeiro?
Hilário Dick – Deixemo-lo primeiramente vir. Claro que é bem-vindo. O povo brasileiro e a juventude brasileira vão estar de festa. Depois, talvez, possamos fazer uma avaliação. Sonhamos, contudo, que nosso Papa não deixe de estimular a juventude do mundo para que sejam uma novidade no seguimento a Jesus Cristo, indo além das sacristias e dos templos, proclamando o Reino de Deus e não só incentivando o amor à Igreja.

Seguirão outras avaliações.