IGREJA-SOCIEDADE ALTERNATIVA

A explicação do sentido desse título, está em ARQUIVO DE POSTAGENS, out. 29 de 2011

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Clericalizão ou clericalismo ? A praga é a mesma.(p 102)

 
Em agosto de 2009, este blog estava começando e o post de número 4 (p4)  versou sobre a apresentação do livro UMA IGREJA DE BATIZADOS. O objetivo do livro, impresso na capa, é: superar a oposição  clérigos  X leigos.Remi Parent, o autor,  desenvolve o tema desclericalização da Igreja, embora ele mesmo seja da classe clerical.. Merece lido. Na Introdução ele dispara: “Este livro é exigente em relação aos clérigos e ao clericalismo, porque se arrogam lugar eclesial injustificado e inaceitável.”  Achei importante mostrar que o Remi não é uma "voz isolada". Outros condividem  a preocupação. Apresento hoje aqui três deles.
GIAN FRANCO
“Mal de Igreja. Dúvidas e esperanças de um cristão em crise.”  Quem está sofrendo do” mal de Igreja” e deu ao seu livro esse título, é o ex-vice-diretor do jornal oficial do Vaticano “ Osservatore Romano”,  Gian Franco Svidercoschi, alguém  informadíssimo sobre a alta cúpula clerical. Responde a uma entrevista. O IHU online divulgou-a.
O repórter lhe pergunta:  A dor e a degradação que o Sr. denunciou no livro, tem a ver com os fatos de hoje? (São os muitos escândalos vaticanos dos últimos anos) GF responde: “Diante do que está acontecendo o meu livro parece ter sido escrito por uma noviça. A crise que a Igreja atravessa é muito mais grave até mesmo do que o  próprio pontífice possa imaginar...È verdade que estamos diante de uma crise de fé .Mas esse é o resultado final de muitas coisas.Instado pelo repórter , GF vai listando essas "muitas coisas..." Vem depois a pergunta final: “O que o Sr. propõe?”.Ele responde:
“Uma premissa. O verdadeiro problema é a clericalização da Igreja. É o retorno de um mal antigo: o domínio dos clérigos. Há um retorno de individualismo e de clericalismo também entre os jovens padres. É a Igreja hierárquica que se sente dona da verdade e não ao serviço dos outros. O que na Igreja devia ser serviço se fez poder. O uso do poder sagrado por parte dos clérigos: esse é o caruncho. Determinando assim uma reação igual e contrária por parte de quem detinha o poder e agora se sente marginalizado. A Secretaria de Estado não está ao serviço do papa; tornou-se um poder. A resposta é voltar verdadeiramente ao Concílio Vaticano II e à colegialidade.”  

SERGIO COUTINHO
Em abril deste ano, o IHU On line, entrevistou o presidente do Centro de Estudos em História da Igreja na América Latina, Sérgio Coutinho.  A certa altura o IHU pergunta o que seria necessário retomar com mais força depois desses 50 anos dos debates conciliares (do Vat.II) e o que ficou esquecido. Ele responde: “Parece-me que uma temática conciliar que necessitaria aprofundar é o da horizontalidade na Igreja”. Resumindo o resto da resposta: Em Medellin e Puebla, os bispos entenderam  que em vez da verticalização vigente, horizontalização significaria comunhão e participação. Por isso a CNBB desenvolveu na ocasião, uma série de instancias participativas,  práticas que favoreciam a participação e a opinião pública, dentro da Igreja. Mas esse processo não prosseguiu. Ao contrário:
“O que assistimos nos últimos 25 anos” diz Sergio, “foi um processo cada vez mais exacerbado de “clericalização”, ou de “verticalização” na Igreja. O estudo de Direito Canônico passou a ser o carro chefe da formação dos futuros presbitérios, mesmo os de Institutos Religiosos. Isso significa que se vêm enfatizando muito mais a obediência às rubricas e normas eclesiásticas do que propriamente na construção de caminhos de evangelização. Conselhos paroquiais cada vez mais centralizados e cumprindo papel meramente figurativo, marcadamente consultivo. Quando for deliberativo, cumpre a função dos membros apenas apertar a tecla de “confirmar” o que pensa o padre.
Desse modo, os institutos de formação presbiteral insistem numa formação para o exercício do culto e para o exercício do poder administrativo-burocrático-canônico, em detrimento do evangelizador-pastoral. É como um padre diocesano, vestido de batina preta, de uma cidade de periferia do Distrito Federal (que por sinal foi ex-aluno meu!) me disse certa vez quando fui conhecer sua comunidade paroquial: “Padre, como estão as coisas aqui?”, respondeu ele de forma muito reveladora: “Estão ótimas! Aqui eu sou o Papa! É melhor ser padre do que bispo, porque aqui todos me respeitam e o bispo nem sempre é respeitado.”O que temos são jovens presbíteros com forte formação estético-disciplinar e pouco ético-pastoral. E é justamente neste nó que passam os conflitos com o laicato, cada vez mais desejoso de participar da vida eclesial, e das muitas  propostas pastorais diocesanas e até das iniciativas da CNBB que ficam emperradas por “pequenos príncipes” mais parecidos com o de Nicolau Maquiavel do que de Saint-Exupéry.
Outro sinal evidente desse sintoma é o esvaziamento das Assembleias dos Organismos do Povo de Deus, sem contar com a quase nenhuma participação do laicato nas Assembleias Gerais da CNBB.”

JOÃO CARLOS OLIVERI
No seu livro,  Igreja,sonhos...ousadias ...mudanças...o Oliveri (ver MINHAS FONTES  na coluna direita do blog)  deu destaque a esse assunto. Hoje só este  breve trecho:
“No atual modelo de Igreja o laicato é tratado como uma criança que tem que estar atenta e obediente aos adultos (os da hierarquia) que indicam, permitem ou proíbem o que fazer. Esta divisão entre clero e povo, com uma valorização em demasia do primeiro, está muitas vezes prejudicando a participação, dedicação e compromisso dos membros com suas respectivas comunidades.
Percebemos com tristeza que as estruturas  eclesiásticas refletem o modelo desta sociedade que queremos superar onde as desigualdades são marca forte.Queremos contribuir para uma Igreja comunidade onde existe verdadeira democracia na gestão da mesma, onde seus membros possam exercer de forma responsável e efetiva sua vocação, seja no presbitério, no ensino das  escrituras, na administração, na organização dos serviços, etc.  Há uma desvalorização das lideranças leigas das comunidades. O clericalismo está tão introjetado na cabeça que às vezes leigos são mais autoritários, moralistas e advogados da instituição que os próprios padres e bispos. Estar na coordenação ou ser ministro na comunidade tornou-se, por vicio de estrutura, uma fonte de poder e de autoridade, desejada por muitos.
Precisa ficar claro que a Igreja que queremos deve refletir a sociedade que queremos. Reafirmamos nossa adesão à Igreja-comunidade, com toda a sua diversidade, para que no respeito  mutuo possa ajudar na construção do Reino de Deus”.

Tenho a intenção de voltar  com esse tema no próximo post. com um excelente texto do Oliveri.