A vivencia concreta das comunidades cristãs antigas (sec.II e III) no seguimento de Jesus é pouco conhecida.No entanto muitas de suas atitudes que devíamos ter conservado, perdemos e nos desfiguramos como povo de Deus. O livro " A Igreja que Jesus queria" do Gerard Lohfink tem páginas preciosas que relatam o que escritores da época testemunhavam sobre os grupos cristãos.
Em seguida transcrevo algumas páginas do capítulo intitulado "A fraternidade cristã".
"Que o
tratamento de irmão e irmã nas comunidades não era apenas uma expressão bonita,
mostra o serviço de assistência, que se estendia, em princípio, a todos os membros da
comunidade, que necessitavam de
auxílio; algo que era revolucionário
frente a sociedade pagã. Tratava-se principalmente, das viúvas, dos órfãos, dos
velhos e doentes, dos inválidos, dos desempregados, dos presos e dos banidos,
dos cristãos que estavam em viagem e de todos os membros da comunidade que
passavam necessidades. Além disso vinha ainda
a preocupação por um enterro digno dos pobres.
Dos elementos mencionados nesta lista, merece realce
especial o cuidado da comunidade por
seus inválidos e desempregados. As comunidades exigiam de todos os que
podiam trabalhar, que trabalhassem e até
arranjava na medida do possível, empregos para eles. Mas quem não podia mais
trabalhar podia estar seguro de receber
auxílio da comunidade. Assim foram criados um sistema de mediação de empregos e uma rede de segurança social, que eram
únicos no tempo antigo. Eles baseavam-se na ajuda mútua e em ofertas espontâneas , que geralmente eram recolhidas
durante a celebração eucarística aos domingos. Assim, dentro de sua conhecida descrição da celebração
cristã, Justino diz:
Mas quem tem os meios e a boa
vontade, dá, conforme seu próprio parecer, o que quer e aquilo que é recolhido,
é depositado com o dirigente; com isto, ele ajuda órfãos e viúvas, aqueles que
por causa de doença ou por qualquer outra razão passam necessidades, os presos
e os estrangeiros que estão presentes na comunidade
(Justino,Apologia I. 67...).
Este
sistema de assistência altamente eficiente,contudo, não se limitava à própria
comunidade local.Temos uma série de provas de que a ajuda se estendia também a
comunidades cristãs vizinhas nas quais surgira uma necessidade especial.Especialmente a comunidade de Roma
era conhecida por sua ajuda a comunidades de outras cidades. O bispo Dionísio
de Corinto escreve à comunidade de Roma, por volta do ano 170:
Desde o começo, vocês tinham o
costume de ajudar a todos os irmãos de várias maneiras e de mandar auxílios a
muitas comunidades em todas as cidades. Pelos donativos que desde outrora
mandaram, mantendo assim, como Romanos, uma tradição romana antiga, vocês
aliviam a pobreza dos necessitados e auxiliam os irmãos que vivem nas minas.
Seu santo bispo Sóter não só manteve este costume, mas ainda o ampliou (Eusébio,História da Igreja IV,
23.10...).
Tanto
dentro das diversas comunidades como na Igreja em sua totalidade, irmandade não
era uma palavra vazia. “Enquanto a doutrina cristã, aos olhos dos seus
adversários parecia utópica e irreal,
ela mostrava-se no seu uso prático como orientação concreta para resolver as
necessidades econômicas e sociais, pelo
menos, dos membros das comunidades “ (H.Kraft...)
Com tudo
isto é claro o que a Igreja antiga entendia com o termo amor (ágape).Não um sentimento nobre, mas uma
ajuda bem concreta – dada especialmente aos irmãos na fé. Esporadicamente ágape pode envolver também pessoas fora
da Igreja, segundo a tradição de Mt 5,43-48.Mas geralmente o termo é entendido
da mesma maneira como é usado na linguagem do Novo Testamento,isto é, amor
mútuo dentro da comunidade. Assim Aristides, em correspondência exata à terminologia
da literatura das epístolas do Novo Testamento, diz, no capítulo 15 de sua
apologia, dos cristãos:
Aos ímpios, eles oferecem benefícios
com solicitude (15,5), uns aos outros eles amam-se (15,7)".
No próximo texto o Lohfink continuará mostrando vivências dos cristãos do II e III séculos.