IGREJA-SOCIEDADE ALTERNATIVA

A explicação do sentido desse título, está em ARQUIVO DE POSTAGENS, out. 29 de 2011

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Aqui o prometido no folheto POR ISTO VOCE NÃO ESPERAVA

Aos leitores deste blog.
Por algumas semanas, além dos posts "normais", haverá outros tipos de textos que servirão de canal de diálogo com pessoas interessadas em participar de um grupo comunitário.Releve o transtorno. Obrigado.


Se você acessou este blog por ter lido o folheto " POR ISTO VOCÊ NÃO ESPERAVA," você deve encontrar aqui duas coisas prometidas no folheto:

1 - uma explicação mais completa sobre o "por que a Religião é contrária ao Evangelho" ?
2 - uma ajuda para resolver no concreto da sua vida, o impasse: ou Religião ou Evangelho.

Hoje cumpro a ajuda número 1.
Nos próximos dias a número 2


1 - Por que a Religião é contrária ao Evangelho de Jesus?

Vou responder usando trechos do artigo do teólogo J.M.Castillo publicado pelo IHU On line ,
artigo que você pode ler por inteiro neste blog nos posts de nº 52 a 64 de 9 de agosto de 2010 em diante. Igualmente trechos da conferência do pe.José Comblin citada no folheto e também
colocações minhas.

Jesus tinha uma espiritualidade de relação com o Pai e com os excluídos.Mas era um leigo, isto é, não era sacerdote. Viveu e apresentou sua mensagem entrando em conflito com a religião judaica que se estruturava em 3 pilares: a Lei, o Templo e os Sacerdotes. Sabemos que esse conflito acabou sendo mortal: Jesus foi perseguido, julgado, condenado e assassinado pela Religião.
Sendo assim, podemos nos perguntar: como é possível a partir da religião entender um homem (Jesus) que foi rejeitado e assassinado pela religião? E portanto, como podemos, a partir da nossa identificação com a religião, viver e praticar um projeto e uma mensagem que foram rejeitadas tão brutalmente pela religião?
Como nós hoje nos identificamos com uma religião? Ou de um modo consciente aderindo a alguma delas, ou inconscientemente, pois nascemos e fomos educados em uma cultura religiosa e em uma sociedade marcada pela religião. Queiramos ou não é um elemento constitutivo da nossa identidade.

A religião é uma criação humana.Há 38.000 religiões catalogadas nos Estados Unidos. Entre a religião católica e as demais, a estrutura básica é igual e se apoiam nos mesmos 3 pilares da judaica: Lei,Templo e Sacerdócio. Na religião há uma distinção entre o sagrado e o profano.E há um clero que se dedica ao que é sagrado. Os outros que estão no profano, são receptores na religião; não são atores.

A mensagem e a vida de Jesus foram historicamente conservados, geridos e controlados por uma instituição, a Igreja, que com o passar dos anos e em virtude de um lento processo, acabou se constituindo em uma religião que é de fato a religião do Ocidente.
São muitos aqueles que atualmente vêem essa transformação como um processo de adulteração e decomposição do projeto original,como nos são descritos pelos documentos fundacionais do Novo Testamento e pelo que sabemos com segurança que aconteceu nos séculos seguintes.

Por aquilo que os evangelhos nos relatam podemos afirmar com segurança que Jesus não pensou em fundar uma Igreja e nem também uma religião.
Jesus foi um judeu que se deu conta de que a religião, a partir do que ele viu e viveu no judaismo do seu tempo, não era nem o que Deus queria, nem o que o mundo precisava. Quando aqui se fala de religião não se entende somente a religião de Israel, mas a religião tal como Jesus pôde ver no seu povo e no seu tempo.

Dissemos que a estrutura básica da maioria das religiões, se assenta na Lei, no Templo e no Sacerdote. Comento um pouco cada um.

A Lei. Jesus não aboliu mas propôs sua plenitude em duas direções opostas: uma linha de maior exigência (não matar,mas também não agredir, não insultar etc).E ao contrário uma linha de maior libertação: violar as normas religiosas do sábado, do jejum, das purificações rituais etc.
Hoje o cristão consciente se oprimido por muitas normas eclesiásticas referentes à moral, à liturgia, às devoções, à organização e gestão das paróquias e dioceses, enfim um "Código de Direito Canônico" servido por considerável burocracia. Pouca coisa disso tudo ajuda realmente para viver o evangelho do seguimento de Jesus.

O Templo. Jesus disse à Samaritana: havia chegado a hora em que os verdadeiros adoradores não adorariam Deus em templo algum mas sim em espírito e verdade (Jo 4, 21-24). Jesus não ia ao templo para cerimônias, mas ia para falar ao povo que nele se concentrava. Sua ação mais violenta foi contra o templo que chamou " covil de ladrões" (Mt 24,1-2). Estevão, o primeiro martir, foi apedrejado principalmente por desqualificar o templo. Quase todas religiões tem templos, igrejas, santuários, catedrais, basílicas, oratórios etc. Mas a igreja não é a casa de Deus, mas dos homens. Deve ser espaço de reunião das comunidades, sem objetos tidos por sagrados, porque no cristianismo só uma coisa é realmente sagrada: o homem e a mulher.

Os Sacerdotes.
A relação de Jesus com eles foi mais do que distante: foi de claro e duríssimo enfrentamento principalmente com os Sumos Sacerdotes, sempre apresentados como agentes de sofrimento e de morte (Mc 8,31;10,33) especialmente no relato da paixão (Jo 11,47-53).
Nos primeiros séculos do cristianismo não havia sacerdotes com funções cultuais, litúrgicas, sacramentais. Havia os presbíteros que eram conselheiros, animadores,evangelizadores. O sacerdócio foi surgindo por obra dos escritos de Clemente Romano,Irineu e Hipólito, que fizeram " o ressurgimento de categorias e de realidades sacerdotais antigas (Velho Testamento) que foram ab-rogadas em Cristo Senhor" (Alberto Parra). Esse mesmo autor enfatiza "o peso da autoridade (Papa) não poderá impedir que se perceba quão diametralmente oposto é o texto de Clemente em relação ao testemunho da revelação que consta no Novo Testamento." Os papas também escrevem coisas contrárias ao evangelho. Nascimento indevido, o do sacerdócio. Confira neste blog uma explicação mais detalhada sobre isso nos posts p45 em diante (11/07/2010)

Na Conferência, Comblin exemplifica vários elementos da igreja católica que podem ser qualificados como "religião." Depois diz: "Porque se quisermos penetrar no mundo de hoje e apresentar o cristianismo ao mundo de hoje, tudo o que é religioso, não interessa. O que pode interessar é justamente o Evangelho, e o testemunho evangélico." E continua: " O que fazer com a Religião? É preciso examinar em todo o sistema de religião o que ajuda, o que realmente ajuda a entender, a compreender, a agir segundo o Evangelho".
Essa sugestão equivale a um critério de escolha; o que ajuda? o que não ajuda? O "nó" é o "examinar". Quem examinará? O Clero ? Dificil. O teólogos? Há várias correntes até divergentes. Além disso o "ajudar" tem um lado subjetivo importante. O que me ajuda pode estorvar um outro. A questão é complexa.Penso que parte dessas dificuldades se dissipem usando o critério apregoado até por parte da hierarquia nas suas exortações : volta às fontes, às origens.

Veja o que Comblin escreveu em artigo na Rev.Pastoral de abril de 2000.
"O que é reforma na Igreja? Trata-se de volta às origens uma vez que houve afastamento delas. Esse afastamento sempre é o mesmo:sair da pobreza, entrar no mundo da segurança, da propriedade e da cultura dominante. O conjunto de uma instituição não volta às origens.Podem não faltar boas intenções, mas uma vez que uma instituição vive no meio de garantias e na cultura dominante, não é mais capaz de perceber que mudou e se afastou das suas origens.O discurso impede a tomada de consciência, escondendo a realidade quando pensa que a está revelando....Toda reforma vem de pessoas novas que estavam nas estruturas e resolvem libertar-se delas para voltar às origens. Saem da instituição para ser mais fieis a ela".

Vamos,pois, nos espelhar nas origens, ou seja, nas comunidades das primeiras gerações de seguidores de Jesus, sem todavia buscar copiá-las, pois os tempos são outros.

Agora leia em cima o segundo texto.



Evangelho e Religião, ainda (p 66)

Como anunciado no post passado, transcrevo hoje parte do artigo que J.M.Castillo publicou no seu blog e o IHU On line divulgou. É um comentário à conferência do padre José Comblin.

"O tema que Comblin propôs é estimulante e dá o que pensar, como já indica o título do tema que tratou: "O que está acontecendo na Igreja?"
Pois bem, do conteúdo do texto de Comblin, me parece que é de singular importância a distinção que faz entre "evangelho" e "religião". Confesso que me dá pena o simples fato de pensar na quantidade de cristãos, batizados, praticantes, pessoas de boa vontade e das melhores intenções, que nem sequer pararam para pensar, alguma vez pelo menos, na diferença radical que existe entre o evangelho e a religião. Comblin o diz da forma mais simples possível: " O evangelho vem de Jesus Cristo. A religião não vem de Jesus Cristo". E isto, o que tem a ver com o que está acontecendo na Igreja? Muito simples: na vida e no funcionamento da Igreja, a religião ocupa mais espaço e tem maior importância do que o evangelho.

Sem rodeios.Me explico. O evangelho expressa a vontade de Deus que busca o homem. A religião expressa a vontade do homem que busca a Deus.Portanto, de entrada, evangelho e religião são dois movimentos radicalmente contrapostos. Isto é a primeira coisa, antes que outra ideia ou projeto, que teria que levar em conta. Assim como teria que pensar seriamente no que isto representa. Por isso, entre outras razões, a religião é um "fato cultural", ao passo que o evangelho é um "fato contracultural". O fato religioso, por mais que tenha como ponto de partida alguma teofania, é sempre um fato que nasce dentro de uma cultura e sempre está marcado por essa cultura. As religiões orientais tem suas peculiaridades muito condicionadas pelas culturas orientais. Assim como ocorre com as religiões africanas, etc.
Pelo contrário, o evangelho é sempre um movimento que interpela os ouvintes da Palavra (que é Jesus) a confrontar-se com não poucos elementos próprios da cultura, como o são, por exemplo, o exercício do poder, as leis sobre a propriedade dos bens,os privilégios dos notáveis, o uso do dinheiro, as relações de parentesco, etc."

No próximo post vou finalizar esse artigo do Castillo.