IGREJA-SOCIEDADE ALTERNATIVA

A explicação do sentido desse título, está em ARQUIVO DE POSTAGENS, out. 29 de 2011

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Os pobres e a libertação. cont. (p 105)

Segue a segunda, das três partes em que dividi este artigo do Comblin. A primeira editei no último dia 21 de setembro.  
O caminho de Jesus
O próprio Jesus entendia que a sua missão  terrestre era o início e o sinal do libertação dos pobres e de todos os oprimidos, de todas as vítimas do reino da violência. Erra preciso entender isso, entender o sentido dessa vida de Jesus. Entender isso demorou. Muitos se deixaram iludir porque achavam que a libertação  se faria na segunda vinda de Jesus, essa vinda que ele mesmo tinha prometido. Muitos esperavam que essa segunda vinda ocorresse em breve. O próprio S. Paulo pensava que muitos dos seus contemporâneos e talvez ele próprio não conheceriam a morte, porque Jesus viria antes. Mas ele não veio como se esperava. Então foi preciso procurar entender de outra maneira o que ele realmente tinha dito, o que realmente tinha ensinado e que não tinham percebido.
Jesus tinha prometido que voltaria depois da sua ressurreição  e depois da sua ascensão. Voltaria para viver com os seus discípulos, para acompanhá-los. Mas era preciso descobrir de que maneira ele estava presente, e o que pretendia fazer. Até hoje muitos cristãos  ainda não sabem isso. Ainda não entenderam. Acham que devemos entender a história no sentido de que Jesus prometeu essa libertação dos pobres para depois do fim deste mundo e do juízo final. Os pobres teriam primeiro que salvar a sua alma para poder entrar no reino de justiça e de paz. Mas com essas condições os pobres não teriam nenhum privilégio porque salvar a alma era uma operação  factível por todos graças aos meios que a religião  colocava a sua disposição. A libertação não  se realizaria neste mundo, mas no outro. Muitos pensaram assim e ainda hoje muitos pensam assim e se dizem cristãos .
A maneira de Jesus
Jesus chama e reúne discípulos e os prepara para refazer no mundo inteiro aquilo que ele  mesmo faz. Desperta para a espera do reino de Deus e pede uma conversão, uma mudança. Qual é essa conversão ? Mudar de vida, dedicar-se a anunciar o reino de Deus a todos. Fundar uma vida social de irmãos na qual ninguém domina nem explora outros. Nessa vida ninguém quer  ser o primeiro, mas todos querem ser servidores dos outros. Os discípulos vão começar essa vida entre eles e convidar os outros a fazer a mesma coisa. É algo muito simples e muito difícil de ser aceito. Como acreditar que esse método possa ser eficaz ? No entanto, a história mostra que tem eficácia, sempre parcial, precária, provisória, que é preciso sempre recomeçar, mas que alguma coisa acontece. Jesus não prometeu a realização  completa da libertação, mas ensina a buscá-la neste terra, neste vida, acreditando nela. Isso é ter fé. Ter fé é acreditar que fomos chamados para construir o reino de Deus no mundo tal como é, sem violência, sem dominação e que  o método de Jesus vale.
Somente os pobres podem acreditar, porque é impossível um rico acreditar nisso. Os ricos acreditam no poder e acham que o caminho é querer sempre mais poder. Dessa maneira aumentam  sem cessar a dominação e a opressão . Para eles esse evangelho de Jesus é pura loucura como já dizia Paulo. Mas para os que confiam em Jesus , é a verdadeira sabedoria.
Como se percorre o caminho de Jesus
Jesus não liberta sem a colaboração dos próprios pobres. A libertação não é um dom que desce do céu e se recebe já acabado. A experiência ensinou-nos que de fato nenhum dom desce acabado do céu. Jesus realiza a libertação pela vida e pela atividade dos próprios pobres. Jesus está neles animando-os para construir esse reino de liberdade.
Os pobres animados por Jesus não  usam, nem procuram as armas dos dominadores, nem as armas, nem o poder político, nem o dinheiro  Não usam os meios pelos quais os donos da terra dominam os pobres e fazem deles os seus escravos. Se buscassem esses mesmos meios, cairiam nos mesmos defeitos. Construiriam outra forma de  sociedade de dominação  mas não trariam a liberdade porque esses meios não  criam a liberdade
A formação  da comunidade
Os pobres formam comunidades de vida. São diversas as formas que essas podem assumir. Pois dependem das condições  históricas. No inicio são  comunidades minúsculas como aqueles que aparecem no Novo Testamento. Mas elas podem crescer e vão crescendo na história. Não são  essencialmente comunidades de culto ou de religião, embora culto e religião  possam ser formas de educação  ou de preparação para  a vida comunitária. Nem sempre culto e religião fazem isso, nem de longe. Muitas vezes culto e religião têm o seu fim em si mesmos, pois respondem a necessidades psicológicas e sociais das pessoas. As comunidades que Jesus cria, são comunidades de vida total, de trabalho, de educação, de habitação, de relacionamento sempre na vida concreta de todos os dias e nunca fora num mundo puramente simbólico.
Podem ser comunidades rurais em que todos tem o seu pedaço de chão e trabalham em conjunto, produzem em conjunto, comercializam em conjunto e crescem em conjunto. Podem ser indústrias dirigidas pelos próprios trabalhadores em forma de cooperativa ou outra. Aliás, pode haver cooperativas em muitas atividades humanas.
Porque essa formação de comunidade é tão lenta? Com certeza porque o sistema estabelecido se defende e usa todos os meios para destruir tudo o que é comunitário. Mas também precisamos reconhecer que muitas vezes os próprios pobres não têm a fé suficiente, não têm a coragem, a audácia, a confiança nos outros que são necessárias para buscar formas de vida comunitária. Nada se faz sem uma fé radical.
As comunidades na história
Historicamente houve e há semelhantes comunidades, de dimensão mais ou menos importante. Há regimes de comunidade parcial: por exemplo quando todo um povo assume a solidariedade nos casos de doença, desemprego, velhice. Há comunidade quando o povo inteiro assume a educação de todos e a mesma educação  para todos. É o que recebeu na época contemporânea o nome de Estado de bem-estar social, ou de democracia social. São expressões comunitárias importantes. Ainda são muito incompletas porque a maior parte dos meios de produção  pertencem a minorias privilegiadas, e é o que permite uma grande desigualdade. Na América latina, no Brasil de modo particular, a desigualdade social é imensa e as classes  sociais praticamente não comunicam, vivem em mundo fisicamente separados. Não se encontram na vida a não ser de modo puramente formal e funcional nas fábricas ou nas unidades de produção, de maneira totalmente desigual. Com essa situação os encontros são manifestações da desigualdade.
Porque os pobres suportam ainda tanta dominação ? Porque se sentem tão fracos frente aos seus dominadores que perdem coragem. Por medo, por falta de audácia, por falta de confiança em si próprios. Falta uma evangelização  forte capaz de suscitar a verdadeira fé. Há toda uma cultura dominante que lhes ensina que são incapazes, impotentes, condenados a sua condição de dominados, porque não há outra sociedade possível. Quem recebe essa mensagem durante a vida toda, perde coragem; Não  confiam uns nos outros e por isso são lentos para unir-se e buscar juntos essa nova convivência humana que pode substituir as estruturas de dominação  existentes.

Termina no próximo post.