Agora uma avaliação da Jornada Mundial da Juventude - JMJ – vista sob ângulo diferente do post anterior.
Li diversos artigos na internet sobre a JMJ realizada em Madri (Espanha) em 2011. Meu objetivo: conferir o que aconteceu lá, desconsiderar o que era próprio da conjuntura sócio-político-religiosa peculiar da região, tanto da nação espanhola como da cidade de Madri e me fixar nos demais procedimentos, para então prognosticar o que poderá acontecer na nossa JMJ brasileira. Um desses artigos me chamou a atenção por relatar fatos e atitudes com olhar crítico. Mas sua força maior é que se trata de uma “declaração “ de um coletivo muito categorizado: a Associação espanhola dos teólogos e teólogas João XXIII. O que esses teólogos espanhóis registram como ocorrido em Madri, já é - para mim - um começo de prognóstico do que poderá ocorrer também na JMJ do Rio em 2013. Vou resumir o texto publicado em espanhol pelo sitio ATRIO em 3 de outubro de 2011.
1 - Houve uma eficaz organização, mobilizando centenas de milhares de jovens de todos os continentes.
2 - Merecem nosso respeito todos os participantes, embora nem todos tivessem motivação religiosa; merecem sobretudo os milhares de voluntários e voluntárias que colaboraram em todo o funcionamento.
3 – Cremos, porém, que não foi propriamente uma Jornada da ” juventude”, nem mesmo da juventude católica, mas uma Jornada do “ papa”, que exerceu o protagonismo em todos os momentos e utilizou os jovens para reforçar seu poder de chefe de Estado e da Igreja. A organização esteve focada na exaltação do papa, beirando a papolatria. Era a confirmação do autoritarismo e do caráter piramidal da Igreja católica.
4 – A ausência de interesse do papa pelos jovens, se manifestou na escassa referencia a seus graves problemas, como o desemprego e a falta de perspectivas de futuro: a crise econômica os atinge especialmente.
5 – A JMJ foi uma clara demonstração do poder da Igreja numa sociedade secularizada e num Estado não confessional.
6 – Preocupa-nos de modo especial a imagem de Jesus de Nazaré e da Igreja, oferecida pelo papa aos jovens, à sociedade e aos próprios católicos: um Jesus de Nazaré espiritualista e desencarnado, uma Igreja espetáculo, patriarcal e ritualista, mais de acordo com os concílios de Trento e do Vaticano primeiro do que do Vat.II O principal empenho da jornada parecia ser levar até o extremo a “restauração eclesiástica”.
7 – A JMJ contou, em cada momento, com o apoio e legitimação do governo central e local, dos empresários e militares; ficou demonstrado assim, o tratamento privilegiado para com a Igreja em nível institucional. Isto nos parece impróprio numa sociedade cultural e religiosamente pluralista e de um Estado constitucionalmente não confessional.
8 – Cremos excessivo o tempo dedicado à cobertura do evento nos canais públicos de TV; outra prova do tratamento em favor da Igreja católica com dinheiro público, e da falta de igualdade entre as religiões.
9 – Igualmente excessivo foi o gasto com a viagem do papa: milhões de euros ; privilégios para os peregrinos e os gastos das varias administrações com segurança, alojamento, etc. Esses gastos mostraram uma vez mais a insensibilidade da hierarquia, incluso o papa, para com as pessoas e famílias castigadas pela crise, com cortes no salário, nos benefícios sociais, saúde etc.
10 – Apesar do desencanto desta visita para muitos coletivos cristãos, temos a esperança de que “outra Igreja é possível” e nessa direção continuaremos a trabalhar, esperando que o façam também o papa e a Igreja institucional, no futuro.
Meu prognóstico para a JMJ do Rio em 2013; a distribuição em parágrafos numerados facilitará o trabalho.
Quanto aos números 1 e 2 não há porque não se repetir também no Rio.
Quanto ao 3, ao 5 e 6, se referem às atitudes e à oratória do papa. Mudarão em aspectos periféricos mas conservarão, aqui, a mesma linha teológico-pastoral, criticada pelos teólogos acima, pois traduzem o modelo de Igreja vigente nas esferas oficiais, em grave crise, mas que não se decidem a modificar.
Quanto ao número 4 : a crise no Brasil não é tão aguda como na Espanha; o nível de desemprego dos jovens é menor, mas também presente e preocupante; e existe muita frustração por falta de perspectivas, pois o sistema capitalista explorador, gera continuamente e em toda parte, essa mesma situação. O papa aludirá a isso?
Quanto ao 7 não sei como será, mas a julgar pela nossa conjuntura parece que as “mesadas” de origem pública, se houver, serão pequenas; já a contribuição empresarial pode ser significativa. A questão é verificar se a ou as empresas financiadoras não tem uma prática nos negócios, reprovável diante do Evangelho. O grande escândalo que atraiu pesadas críticas da JMJ de Madri, especialmente por parte do” Forum dos padres de Madri”, uma agremiação de 120 sacerdotes, foi que o cardeal Rouco Varela, bispo de Madri, angariou e recebeu muito dinheiro de empresas espanholas de “duvidosa ética”, quanto à exploração e outras delinqüências, como descreve a reportagem de Jesus Bastante, publicada pela IHU on-line. Esperamos transparência sobre a captação de recursos no JMJ do Brasil.
Quanto ao 8, também é esperar para ver como será.
Quanto ao 9, uma pergunta obrigatória: quem pagará as despesas de viagem e hospedagem do papa e comitiva, ao Brasil, por vários dias? Será que como em Madri, alguns grupos vão fazer passeata , portando cartazes: “O PAPA VIAJA, O PAPA PAGA”; ou “ DOS MEUS IMPOSTOS, ZERO PARA O PAPA”? Vamos esperar transparência nisto também.
Oportunamente, voltarei ao assunto.