Além de comentar, tive a ousadia de tecer algumas críticas (posts de 26-11-11 a 24-12-11) ao artigo do insigne Leonardo Boff, intitulado "Onde está a verdadeira crise da Igreja?" Boff aponta como um dos sintomas da crise da Igreja romana, a defasagem dela diante da cultura contemporânea. Chega a escrever: " O cristianismo precisa se apresentar em perfeita coerência com a maneira de pensar e a forma de viver da grande maioria das pessoas do nosso tempo". Já li coisas semelhantes em escritores igualmente respeitáveis.
Essa teoria se contrapõe ao conceito de Igreja-sociedade alternativa, título do meu blog. Urge aprofundar o que diz o Evangelho a respeito, pois abordei de modo superficial, nos citados posts de 2011.Para começar é bom lembrar que Religião é um fato CULTURAL e o Evangelho é um fato CONTRACULTURAL. (ver post de 12/2/11)
Em Gerhard Lohfink (ver Minhas Fontes) encontro fundamentação bíblica luminosa para esse aprofundamento. Cito-o textualmente.
Essa teoria se contrapõe ao conceito de Igreja-sociedade alternativa, título do meu blog. Urge aprofundar o que diz o Evangelho a respeito, pois abordei de modo superficial, nos citados posts de 2011.Para começar é bom lembrar que Religião é um fato CULTURAL e o Evangelho é um fato CONTRACULTURAL. (ver post de 12/2/11)
Em Gerhard Lohfink (ver Minhas Fontes) encontro fundamentação bíblica luminosa para esse aprofundamento. Cito-o textualmente.
“...quanto
mudou a consciência eclesial na Europa ocidental em brevíssimo tempo. Ninguém
mais quer ser representante de uma ecclesiologia gloriae. Como reação, porém, aparece uma
imagem de Igreja – articulada ainda por poucos teólogos mas existente no background da consciência de um número
bem maior - exatamente contrária: é a imagem de uma Igreja completamente
inaparente e profundamente mergulhada na sociedade humana, que renuncia a sua
estrutura própria quase até a dissolução
de si mesma, que se perde no mundo para penetrar
o mundo todo. No fundo está a imagem do fermento que penetra a massa e
do qual , no fim, não resta mais nada.
...Certamente,
uma parte das tendências nesta imagem de Igreja é correta e indispensável: a
renúncia a qualquer triunfalismo eclesiástico; ...A ideia, que a Igreja deve
mergulhar na sociedade restante até quase o abandono de si mesma, será realmente
o caminho certo para mudar a sociedade? Sem dúvida os Evangelhos pensam aqui de
modo bem diferente. O texto decisivo em sentido contrário é Mt 5,13-16:"
“Vós sois o sal da
terra. Ora,se o sal se tornar insosso, com o que salgaremos? Para nada mais
serve, senão para ser lançado fora e pisado pelos homens.Vós sois a luz
do mundo.Não se pode esconder uma cidade situada sobre um monte.Nem se
acende uma lâmpada e se coloca debaixo
do alqueire, mas no candelabro, e assim ela brilha para todos que estão em
casa. Brilhe do mesmo modo a vossa luz diante dos homens, para que, vendo as
vossas boas obras, eles glorifiquem vosso Pai que está nos céus”.
"No primeiro
momento poder-se-ia pensar que o texto confirme a ideia de que a Igreja deve
mergulhar tão profundamente na sociedade que mal possa ser reconhecida. O sal não se dissolve completamente na comida ?
Mas isso
significa errar totalmente o alvo apontado pela imagem....Os discípulos de quem
se fala aqui e que na concepção de Mateus, significam a Igreja toda, devem
estar dispostos, em todos os tempos, a salgar o mundo, isto é, fazê-lo saboroso
e preservá-lo da podridão.... Além disso,
também a imagem da luz e da cidade se encaixam muito bem neste contexto.Na
composição de Mateus ambas as imagens formam um conjunto. Não se trata de uma
cidade qualquer, mas da cidade santa, de Jerusalém escatológica da qual os
profetas dizem que um dia sobressairá de todas as montanhas e sua luz iluminará
as nações pagãs (cf.Is 2,2-5). Às boas obras em Mt 5,16 corresponde em Is 2,3s
a Tora, que sai de Sião e se torna plausível a todas as nações, porque está sendo
vivida realmente em em Israel. Em
Mateus, no lugar da Tora de Sião está a ordem de vida e a ordem social do
grande discurso programático que Jesus pronuncia no monte...
O
sentido é exatamente o seguinte: por sua
vida segundo a vontade de Deus, os discípulos transformarão a humanidade
inteira. Cada vez mais pessoas juntar-se-ão
à comunidade daqueles que se orientam pela vontade de Deus.
A Igreja
aqui descrita , é tudo menos uma comunidade que gira de modo elitista, em torno
de si mesma, ou se protege do mundo. Ela
é sal da terra, luz do mundo, cidade que brilha ao longe...ela vive uma ordem
social plausível para os homens (Mt 5,16)...Ela é isso exatamente pelo fato de ela mesma não se tornar mundo ou se
dissolver no mundo, mas guardar seus contornos próprios .Isto mostram não
só as imagens do sal, da luz e da cidade, mas também o contexto em que está Mt
5,13-16. Este texto é precedido imediatamente pelas Bem-aventuranças, que na
verdade não descrevem uma sociedade adaptada; e é seguido imediatamente pela
nova Tora do povo de Deus que começa com a descrição da justiça melhor.
Lendo Mt
5,13-16 no seu contexto e a partir do
pano de fundo do Antigo Testamento fica claro: a cidade luminosa sobre o monte
é “cifra” da Igreja enquanto sociedade de contraste, a qual, exatamente,
enquanto sociedade de contraste transforma o mundo. Perdendo seu caráter de
contraste, seu sal torna-se insosso e se ela apagar sua luz suavemente (no
texto: colocar a luz debaixo do alqueire para ela se apagar), ela perde o seu
sentido. Ela é desprezada pelos demais homens (no texto: pisada) e então a
sociedade não é mais capaz de reconhecer a Deus (no texto: glorificar a Deus
como Pai).
...Mas sendo
assim, então, uma eclesiologia somente é correta, quando mantém com firmeza que
também na Igreja e nas comunidades cristãs o Reino de Deus já deveria estar presente visível, palpável e experimentável ainda que não plenamente
realizado. A situação das pessoas do tempo de Jesus deveria ser a situação dos
tempos de hoje: Felizes os olhos que veem o que vós
vedes! Pois eu vos digo que muitos profetas e reis quiseram ver o que vós
vedes, mas não viram, ouvir o que ouvis, mas não ouviram (Lc 10,23s par.Mt
13,16s)."
RECAPITULANDO
O sal e o
fermento desaparecem na massa, mas a Igreja deve salgar e fermentar sem
desaparecer: estar presente visível, palpável e experimentável sem deixar de ser um grupo alternativo e de
contraste com os valores da cultura
capitalista reinante. O que autoriza o G.Lohfink fazer essa interpretação ? Exatamente o CONTEXTO em que estão os tópicos sobre sal e fermento dentro de Mt 5,13-16 e nos seus arredores.
A interpretação Bíblica não pode deixar de ser contextualizada. Se for ao pé da letra, vira o que virou a Eucaristia na interpretação fundamentalista da "instituição", feita pela igreja católica.
Um comentário:
Também a mim parece muito contextualizada a interpretação em questão. A mensagem do Reino deverá ter sempre o efeito de transformar o mundo e não de se confundir com ele. Essa é sua finalidade, como o sal tem a sua própria. Mas, estarei atento para aprofundar mais o assunto.
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